quinta-feira, 25 de julho de 2013

Transporte Público: uma das soluções para o desmatamento urbano

Área verde por habitante é insuficiente em São Paulo por causa da especulação imobiliária, verticalização e política que privilegia o transporte individual. Em Curitiba, onde os corredores de ônibus fizeram parte do desenvolvimento da cidade, índice de área verde por habitante é quatro vezes maior.
ADAMO BAZANI – CBN
Além do desmatamento de grandes ecossistemas, um problema muito grave e que é pouco discutido é a perda de área verde urbana. E de acordo com especialistas, isso se deu, entre outros motivos, pelo privilégio ao transporte individual. Corredores de ônibus, além de melhorarem a mobilidade urbana, ocupam melhor o espaço nas cidades e podem ter áreas ajardinadas ao longo de seu percurso. Exemplos são a Linha Verde de Curitiba e o Corredor ABD, em São Paulo, operado pela Metra. Foto: Adamo Bazani
Além do desmatamento de grandes ecossistemas, um problema muito grave e que é pouco discutido é a perda de área verde urbana. E de acordo com especialistas, isso se deu, entre outros motivos, pelo privilégio ao transporte individual. Corredores de ônibus, além de melhorarem a mobilidade urbana, ocupam melhor o espaço nas cidades e podem ter áreas ajardinadas ao longo de seu percurso. Exemplos são a Linha Verde de Curitiba e o Corredor ABD, em São Paulo, operado pela Metra. Foto: Adamo Bazani
Quando se fala em desmatamento, logo se pensa na destruição de grandes ecossistemas como a Amazônia e a Mata Atlântica. E realmente o problema é preocupante. De acordo com o Global Forest Resources Assessements, que é o indicador da ONU – Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO – sigla em inglês) que monitora as florestas no Planeta, o Brasil foi o país que mais perdeu área verde nos últimos onze anos em todo o mundo. Ao todo foram perdidos 55,3 milhões de hectares. De acordo com o Ministério do Verde e do Meio Ambiente, restam apenas 7% do território original da Mata Atlântica.
Mas existe um outro grande problema que é pouco discutido e que pode ser considerado de extrema gravidade em relação ao meio ambiente: a perda de área verde urbana.
Dados da Prefeitura do Rio de Janeiro mostram que a área verde por habitante na cidade caiu 26% de 2011 para 2012.
Em São Paulo, de acordo com a prefeitura, no mesmo período, as áreas verdes públicas por habitante caíram em nove das trinta e uma subprefeituras da cidade, também entre 2011 e 2012.
Só na região do Jabaquara, a perda foi de 59,5%, onde o índice de área verde por habitante caiu de 5,98 metros quadrados para 2,41 metros quadrados. Em Pinheiros, a queda foi de 58,5%, passando de 5,26 metros quadrados de área verde por pessoa para 2,18 meros quadrados.
Segundo a Sociedade Brasileira de Arborização Urbana – SBAU, órgão reconhecido pelo Ministério do Meio Ambiente e formado por equipes multidisciplinares, o índice mínimo de área verde recomendado por pessoa numa área urbana é de 15 metros quadrados. São Paulo atingiu número inferior: 14,58 metros quadrados. De acordo com a ONU, a cidade mais verde do Brasil é Curitiba, com índice de 64 metros quadrados de área verde urbana por morador.
E a comparação entre as duas cidades não poderia ser mais propícia.
A diferença entre elas se dá no modelo de crescimento urbano e na opção de política pública de mobilidade.
E essa diferença é a prova de que uma política que opte pelo transporte público é essencial para a manutenção e recuperação de áreas verdes urbanas que, além de melhorarem a qualidade do ar nas cidades, as deixa menos impermeáveis e suscetíveis às enchentes.
São três os principais motivos para as cidades perderem área verde
1) Falta de planejamento urbano com crescimento desordenado
2) Verticalização das edificações, onde se concentra mais pessoas numa mesma área e os terrenos perdem quintais e pequenas plantações
3) Privilégio ao transporte individual que usa mal o espaço urbano.
Em Curitiba, no ano de 1974, o então prefeito Jaime Lerner, ao projetar os corredores de ônibus do tipo BRT (Bus Rapid Transit) não apenas escolheu um modelo de mobilidade, mas um modelo de cidade, no qual, as pessoas teriam prioridade e não os carros. O corredor de ônibus acabou organizando fisicamente e conceitualmente o crescimento da cidade.
Apesar de hoje a demanda de passageiros em Curitiba e na região metropolitana exigir mais corredores, como a Linha Verde, que compactua corredor de ônibus com ciclovias e áreas ajardinadas, o modelo é considerado exemplo a ser seguido.
Já em São Paulo, apesar da existência hoje de uma tímida malha de metrô e de corredores de ônibus de fato para a demanda e para as proporções da cidade, a opção histórica foi o transporte individual. E a população, com a perda de qualidade de vida e de saúde, tem pagado caro por esta opção. Para se ter uma ideia, os hospitais estão lotados de pacientes com problemas agravados pela poluição. Só na cidade de São Paulo, cerca de 4 mil pessoas por ano perdem a vida por causa de doenças ocasionadas ou agravadas pelos altos índices de poluentes, segundo a USP – Universidade de São Paulo.
A frota de carros na cidade cresceu de forma vertiginosa, assim como a população urbana. São Paulo foi o estado preferido pelas grandes montadoras de automóveis.
E para receber uma população maior e uma frota de carros que proporcionalmente cresceu cerca de dez vezes mais rapidamente que o número de pessoas, muita área verde urbana foi perdida. Canteiros foram transformados em mais faixas para carros. Leitos de rios viraram marginais, que foram ampliadas, alargadas, mas que tempos depois se tornaram insuficientes para a frota de carros. Prova disso foram as pistas centrais da Marginal Tietê, que dois anos depois já tinham perdido todo benefício que haviam proporcionado.
Isso porque existe um ciclo vicioso. Carros pedem mais vias e mais vias atraem mais carros.
A conta é simples. Um ônibus urbano convencional mede 13,2 metros de comprimento e pode levar em torno de 80 pessoas. Um carro em média tem 4,07 metros de comprimento. Como na maior parte das vezes os carros circulam só com o motorista e no máximo com mais um ocupante, seriam necessários 40 carros para levarem a mesma quantidade das pessoas no ônibus. Só que enfileirados, sem nenhum espaço entre eles, estes carros em vez de ocuparem os 13,2 metros do ônibus usam 162,8 metros.
Um passageiro de ônibus ocupa 1,96 metro quadrado de espaço urbano e um motorista de carro ocupa cerca de 10 metros quadrados.
Essa brutal diferença faz com que, ao não priorizar o transporte coletivo, se pedesse espaço que poderia ser de áreas verdes e para convivência entre as pessoas. Hoje, as cidades têm se tornado lugar de sobrevivência e não mais de convivência.
Além disso, os corredores de ônibus podem ser delimitados por jardins. Entre a Capital Paulista e municípios da região do ABC, a empresa Metra, concessionária do Corredor ABD – São Mateus / Jabaquara criou em 2008 o Corredor Verde. Até agora já foram plantadas cerca de cinco mil mudas de árvores, que neutralizam o carbono emitido pelos carros ao redor do corredor. Parte da frota da Metra é também operada por veículos não poluentes, como os trólebus, ou que poluem menos, como os ônibus elétricos híbridos.
O poder público também deveria, de acordo com especialistas, criar normas para que o cidadão participe de forma mais ativa na recuperação do verde urbano. Parece que não, mas se cada uma das milhões de edificações em São Paulo ao menos tivesse um jardim de três metros quadrados, isso faria uma enorme diferença no conjunto para a cidade.
E voltando à questão inicial do desmatamento dos grandes ecossistemas, eles só existem para servir ao crescimento irregular e às políticas arcaicas e equivocadas das cidades.
Adamo Bazanijornalista da Rádio CBN, especializado em transportes

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